quarta-feira, novembro 18, 2009

Incendiário

Escrevo após incêndios
Quando tudo é desmanche e brasa morta
Quando palavras em cacos, pedaços, carvão
Anseiam respirar fora dos escombros

De ruínas ergo varandas e sacadas
De muros caídos levanto palácios
De mansões fumegantes faço jardins
De ruas esburacadas pavimento pisos decorados

Em versos e estrofes reconstruo a cidade
Casas sucumbidas ao fogo voltam a aquecer
Fábricas apagadas retomam seus barulhos
Esquinas de cinzas espalham cruzamentos

Não me prosto ao caos e ao desespero
Não me prosto à bomba e ao meteoro
Não me prosto ao trovão e à enchente
Não me prosto ao assassino e à fuga

Permaneço e me elevo
Subo a escada que construi
Chamo os habitantes às moradas
Antes mortos, agora vivos, natos

Escrever é obra de ressurreição
Empreitada de três dias (ou nem isso)
Ascendo ao céu quando tudo pronto
Então deito e descanso e amanheço

Me carrego de substantivos e vírgulas
Até que alguém grite verbo inédito
No quinto andar de um prédio em chamas
Espero o desabamento e vou

Levo pás e tratores
Numa caixa, livros e discos
A letra é manifesto quando sufocada
A canção é linda quando reverbera no pó
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